Durante quase todo o mês de Julho (de 1 a 29) o calendário Islâmico celebra o Ramadão. É o nono mês deste calendário, que por ser lunar faz com que este período de celebração festiva, mas também de oração e sacrifício, seja itinerante consoante os anos.
É também o período onde os seguidores da fé islâmica guardam jejum e uma maior proximidade com os valores religiosos proclamados no Alcorão.
O jejum deve ser vivido durante um período compreendido entre as 4 da manhã (hora do nascer do sol) até às 21 horas (hora do pôr do sol). Só depois de o horizonte se vestir de noite é que o crente deverá comer e beber. Durante o dia será privilegiada a oração.
É também um período delicado e exigente para os atletas profissionais, defensores da fé islâmica, porque têm de conciliar este sacrifício com o esforço físico do trabalho diário.
No plantel do Rio Ave FC há dois atletas que vivem este mês tentando equilibrar na balança a fé e o profissionalismo. Hassan e Wakaso não prescindem do Ramadão mas também não querem perder a preparação da pré-época.
Para o egípcio Hassan a vivência deste período é fundamental para o crente.
Hassan – “É um período de festa e alegria para ser vivido em família. Talvez comparável com o Natal aqui (Portugal), um período de festa. Em todos os países arábicos é assim. É o melhor mês que nós temos no nosso calendário. Não comemos nada nem bebemos do nascer ao pôr-do-sol. Depois fazemos uma vida normal”.
Para Wakaso é uma forma de estar na vida. No Gana a fé islâmica tem raízes muito profundas e o Ramadão vive-se intensamente.
Wakaso – “É muito importante para a nossa vida. Nunca sabemos se morremos amanhã ou outro dia qualquer, nunca sabemos o que nos acontece. E se somos muçulmanos temos de cumprir o jejum. É uma questão de fé, no que acreditamos.”
Hassan – “É um sacrifício que fazemos para lembrar que há pessoas que não têm dinheiro para comer e beber. Queremos sentir o que eles sentem. Nós temos dinheiro, posses e por isso temos de viver as dificuldades dos que não têm”.
A fé “choca” com a postura profissional de quem tem de trabalhar muito num grupo para competir ao mais alto nível. O sacrifício vai além do jejum, é elevado a um expoente de dificuldade máximo porque se esgotam as energias que não se tem no trabalho diário.
Hassan – “ É muito difícil conciliar o Jejum com o trabalho físico de jogador de futebol porque trabalhamos muito na pré-época, o período mais importante da época dos clubes e a mais exigente. Seria mais fácil se pudéssemos beber, mas não podemos e sentimo-nos fracos, sem forças com um trabalho tão duro.”
Wakaso – “É difícil, mas treinar é tão importante quanto o jejum”
É aqui que entra o espírito de grupo. A ajuda dos colegas que encorajam e compreendem. E ajudar não é só “dar uma palmada nas costas” de ânimo.
Hassan –“Gosto muito a forma como os treinadores compreendem a nossa situação. Eles respeitam a nossa religião e por isso sugeriram um plano de trabalho diferenciado. Treinar de manhã, depois dormir e treinar novamente á noite e, claro, nós ficamos agradecidos”.
Para os crentes de outras religiões, credo ou fé, a prática do Ramadão pode fazer alguma confusão (tal como as tradições cristãs farão a islâmicos ou a outros). Depois há muita contra-informação ou informação errónea sobre este ritual festivo.
Por exemplo, imagina-se e afirma-se que se pode pagar uma determinada quantia de dinheiro para poder não cumprir o Ramadão…errado.
Hassan -“Imaginem que temos um jogo. No jogo é difícil aguentar e competir cumprindo o jejum porque temos de beber muitos líquidos. Então há a possibilidade de, em alguns jogos, não se cumprir o Ramadão, mas depois do Ramadão tem de se cumprir esse dia de jejum e procurar uma família carenciada e oferecer-lhe comida para as necessidades deles”.
Hassan e Wakaso trabalham no duro com os colegas, acompanhados de perto pela equipa técnica e staff, com a compreensão de todos, mas sem facilitar na preparação física da época.
Há casos em que o atleta pode perder peso e energia, mas o sacrifício e os valores nobres da causa justificam o esforço, esta forma de viver a fé e celebrar a família e a solidariedade. Este é um dos 5 pilares da fé islâmica, sem ele os dois atletas do Rio Ave FC também não se sentiram completos para desempenhar a vocação e devoção ao clube a cada treino e a cada jogo.