O tempo é de paragem competitiva mas o Rio Ave FC ainda suspira depois de um dos ciclos mais infernais da sua experiência europeia.
Que merecido repouso este, promovido pela paragem para compromissos internacionais, para uma equipa que tanto deu num mês de Setembro – e princípios de Outubro – escaldante e que perdurará nas memórias dos rioavistas.
Foram 18 dias de pura loucura com 6 jogos de alta rotação, viagens, prolongamentos, grandes penalidades, desgaste emocional e físico, mas deste, nem demos conta, tal a bravura com que os jogadores de Mário Silva encararam cada batalha. Mas já lá vamos.
Do intenso mês de Setembro saíram duas históricas vitórias na Liga Europa, frente ao FK Borac e Besiktas, e dois empates na Liga NOS, contra Tondela e Vitória SC. Já em Outubro veio o drama diante do AC Milan e a igualdade em Famalicão.
Mas embarquemos nas dificuldades sentidas pelo Rio Ave FC para debater-se com tão grande desafio. Parecia ter pela frente um verdadeiro adamastor mas, passo a passo, os rioavistas mostraram que a pré-época, também ela atípica, foi bem delineada e o trabalho de casa foi feito.
Primeira viagem, Banja Luka, na Bósnia. O sorteio europeu ditava uma jornada que, entre ida e volta, acumulava 5600 quilómetros, mais de 6 horas de avião. Jogo durinho, contra uns bósnios sedentos de história, que só foi desatado já ao minuto 90 com golos de Tarantini e Jambor.
Apenas 72 horas depois, viagem a Tondela para a estreia no campeonato e mais 3 horas de autocarro e 300 quilómetros percorridos. Nesse jogo, contra as previsões dos mais cépticos, foi o Rio Ave FC a dominar e a terminar a segunda parte em cima dos tondelenses que, pasme-se, caíam em catadupa com problemas físicos. Quem diria.
Quatro dias apenas de interregno e 3900 quilómetros depois, eis Istambul. Novo duelo europeu, este de elevada dificuldade, a exigir o melhor Rio Ave FC. E que Rio Ave FC tivemos! Igualdade no fim dos 90 minutos, prolongamento, grandes penalidades e festa verde e branca no Vodafone Park. Incredulidade nos turcos. Istambul caiu.
Regresso a Portugal, e mais 3900 quilómetros no bolso, com um acumulado de 9 horas de avião entre ida e volta, afigurava-se novo obstáculo difícil no caminho.
Um treino apenas para preparar a recepção ao Vitória Sport Club, de Edwards, de Ricardo Quaresma, de uma imensa vontade de se estrear nas vitórias. Temeriam o pior, porventura, aqueles que já vaticinavam dificuldades físicas na equipa de Mário Silva. Não caíram! Não terá sido um jogo bonito, de parte a parte, até pela ausência de grandes oportunidades de golo, mas foi um jogo intenso, competitivo, tacticamente exigente, que mais uma vez desgastou a equipa que, 72 horas antes, disputava 120 minutos com o Besiktas, na Turquia.
Valentes! Nova igualdade no campeonato, sem sofrer golos, permitindo agora virar o foco para um renomado adversário: o heptacampeão europeu AC Milan.
Apenas 4 dias depois, o Rio Ave FC recebia o jogo mais mediático da sua história, o adversário mais titulado que alguma vez defrontou, e as crónicas não eram meigas: os rioavistas iam passar dificuldades.
Ora bem, aquele dia 1 de Outubro mostrou que não há impossíveis quando a ambição e determinação levam à superação. Apesar de todo um histórico recente de viagens, jogos, pouco descanso, Mário Silva viu a equipa brilhar diante do AC Milan, obrigar o colosso italiano ao prolongamento, marcar e colocar-se em vantagem com um golo do irreverente Gelson Dala. Tudo encaminhado para uma história incrível de perseverança e superação, que esbarrou a 13 segundos do derradeiro apito pelo mais terrível dos infortúnios. O AC Milan chegou ao 2-2 no minuto 120 e obrigou a umas grandes penalidades que ficarão na história do desperdício e do azar.
O Rio Ave FC, eliminado da Liga Europa com um dramático final inesperado nos penáltis com o AC Milan, não tinha tempo para parar e menos de 72 horas depois tinha, por fim, o último jogo deste ciclo infernal.
Em Famalicão, para a 3ª jornada do campeonato, temia-se o pior, menos cá dentro. Quando seria mais do que legítimo ver jogadores em quebra, eis que os rioavistas deixaram novamente meio mundo boquiaberto, conseguindo, já na segunda parte, encostar o Famalicão ao seu último reduto, empatar o jogo e, até, estar muito perto da vitória. Incrível!
Mérito do trabalho de qualidade que a equipa realiza desde o primeiro dia da temporada, reflectido na forma como foi sempre uma equipa competitiva, agarrada ao jogo, cheia de vida, em cada um destes seis jogos disputados em tão curto espaço de tempo. Ciclo cruel pela forma como levou a equipa aos limites, como testou os jogadores no ‘red line’ das emoções, mas demonstrativo da sua capacidade, qualidade e valor.
De todos, destaca-se a disponibilidade física de jogadores como Santos e Toni Borevkovic (ambos com 555 minutos cada) e de Pawel Kieszek, que jogou os 600 minutos que estes seis duelos tiveram. Mas e o que dizer de Tarantini? Com 37 anos, o médio e capitão de equipa jogou em todas as partidas até agora, acumulando uns incríveis 466 minutos. Notável.
Ao todo, entre 17 de Setembro e 4 de Outubro, o Rio Ave FC viajou por quase 14 mil quilómetros, acumulou 15 horas de avião, 4 horas de autocarro, jogou 600 minutos, 240 dos quais em dois encontros que foram a prolongamento e grandes penalidades, apenas 72 horas antes de novo jogo para o campeonato.
Terminar este ciclo sem derrotas, se considerarmos que a eliminação com o AC Milan, na verdade, vem de um empate a dois no prolongamento, e com o Rio Ave FC quase como orgulho nacional pela forma como caiu de pé diante de um gigante europeu, só pode deixar o grupo optimista para uma época com tanto ainda para conquistar.